terça-feira, 23 de agosto de 2011

UM DIA DE HANK - PARTE 01



 Desliguei a luz, fechei a porta e desci as escadas. Eram quatro andares. Desci de dois em dois degraus. As paredes gastas e amareladas tornavam o lugar mais decadente. Uma porta entreabriu e fechou logo em seguida. Algum morador entediado com a TV procurando vida ao vivo. Olhei a rua quase deserta. Olhei o relógio, 22:45. Fiquei na dúvida entre pegar um taxi ou ir a pé. Eram apenas dez quadras, resolvi caminhar. Acendi um cigarro e fui andando sem pressa. Dobrei a esquina e comecei a descer a ladeira. Eram meados de setembro e a brisa soprava constante no meu rosto. O céu estava com pouquíssimas nuvens e as estrelas se emaranhavam de tantas que haviam. Fazia tempo que não via um céu tão estrelado. Um bêbado de aspecto lastimável me parou e pediu um cigarro. Enquanto tirava o maço do bolso ele coçou o fundo das calças, que por sinal estavam aos farrapos, e perguntou:

-  O companheiro sabe a quanto fechou o dólar?

Entreguei o cigarro, fiz que não com a cabeça e continuei andando.

- Ei! Ei!

Olhei pra trás e era o bêbado novamente.

- Tens fogo?

Acendi seu cigarro.

- Obrigado companheiro. Vá com Deus.

No caminho dei de frente com putas, veados, esmoleis e drogados. Todos tentando alguma coisa comigo. Segui em frente sem dar atenção. Já havia feito minha boa ação da noite com o bêbado economista.

Chegando na porta do bar um taxista me aborda.

- Doutor, precisando de companhia pra noite é so falar comigo. São todas de primeira. Franguinhas selecionadas. Carne nova doutor!

Agradeci e entrei no bar. Sentei no primeiro banco que encontrei no balcão.

- Por favor um whisky e uma água.

O garçom so me olhou de canto de olho e trouxe meu pedido. O bar estava com todas as mesas ocupadas. Uma mistura de turistas, boêmios, bêbados e putas. Sem sombra de dúvidas não era ambiente familiar. Tocava alguma coisa meio merengue meio salsa. Nunca fui bom em diferenciar as duas. Que seja. Olhei para o copo e virei de um trago so.

- Mais uma dose amigo.

Logo o copo já estava novamente abastecido. A luz era pouca mais dava pra ver o semblante das pessoas. Todas meio sem vida. Poucas feições.Procurei um espelho ao redor para ver se eu aumentava as estatísticas. Fiquei em dúvida.

- Um cidadão que estava sentado ao meu lado que desde que eu cheguei não tirava os olhos da TV se virou e falou:


- Estes chineses vão dominar o mundo!

Olhei e dei um sorriso forçado..

E o sujeito continuou.

- Estes amarelos de merda vão fuder com o mundo! A economia vai se render a eles. Tudo é feito na China. Daqui a pouco vou dar um cagalhão e vai ter "Made in China" nele.

Fiz que concordei com a cabeça e ele logo voltou a olhar para a TV.  Mal terminei minha dose e ele novamente interrompe:

- Esses politicos sempre se safam. Esse ai subornou o juiz da...

- Ah, vai se fuder  - Falei pra ele e fui sentar na outra ponta do bar.

Ele ficou parado me olhando com cara de bunda mal lavada e ainda ouvi ele dizer:

- Esse cara é um maluco...

Que se foda ele e quem concordar. Tava cheio de papo trivial. Pedi mais uma dose e uns amendoins pra forrar o estomago. Eram 23:20 e o bar ainda estava cheio para uma quinta-feira. Lembrei que bem cedo teria que ir numa entrevista de emprego em uma loja de autopeças. O salário era um lixo, mas minha reserva estava no fim e logo teria que pagar o aluguel. Meu último emprego durou 23 dias como vendedor numa loja de roupas safadas. O Gerente me pegou tomando uns tragos no deposito no intervalo do lanche e me colocou na rua. O filho de uma puta nem imaginava que eu estava enrabando a Charlene, auxiliar do financeiro, que por sinal era sua filha.
Prefiro beber a comer. Me da mais animo.
Umas putas entraram no bar rindo alto e uma delas veio em minha direção. Era uma mulata bem alimentada e de sorriso largo.

- E ai, ta afim de companhia?

- Não to afim de trepar hoje, mas se quiser um trago eu pago.

Ela sentou e falou:

- Gil, o mesmo que meu amigo aqui ta bebendo.

Ficamos calados por um tempo e ela perguntou:

- Foi corneado ou despedido?

- Estou tão acabado assim – Eu perguntei

- Ta com uma cara de que comeu merda estragada.

Sorri. Era o que me restava.

- Mudei de idéia. Gostei de você. Vamos lá  pra casa.

- Gil, a conta.

Passamos numa loja de conveniência e comprei um garrafão de vinho barato. Precisava dar uma aliviada para a entrevista de amanhã.


 Eduardo Ramos


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